Há alguns dias, publicámos no nosso site um artigo sobre uma das rainhas mais influentes e poderosas do antigo Egito, a rainha Tiy, esposa principal de Amenhotep III, faraó da XVIII dinastia que ficou na história com o apelido de «O Magnífico». Tiy é um exemplo admirável de como uma mulher sem sangue real conseguiu alcançar os mais altos escalões do poder na corte faraónica.
De facto, a vida de Tiy é fascinante, mas não menos fascinante é a de seu marido, o faraó, um homem que subiu ao trono do Egito ainda criança e teve um longo reinado. Amenhotep III reinou durante 38 anos, entre 1390 e 1952 a.C. O seu reinado é considerado um dos mais prósperos da história do Egito, e não é de admirar. Durante todo esse tempo, não houve muitas guerras (sabe-se de uma expedição militar à Núbia), mas sim muitas campanhas de construção. A Amenhotep devemos o templo de Luxor, em Tebas, bem como o seu grandioso templo funerário na margem ocidental do Nilo.
Mas o faraó não se contentou com isso. Amenhotep III mandou construir um extraordinário complexo palaciano de 227 000 metros quadrados, também na margem ocidental do Nilo, em Malkata, que recebeu o nome de Per Hai (a casa da alegria). Mas por que Amenhotep quis construir um palácio neste local e, além disso, um tão grande e fastuoso?
Alguns especialistas acreditam que o soberano construiu Malkata para celebrar os seus jubileus reais ou festivais sed, embora outros opinem que, na realidade, Malkata se tornou a residência «oficial» do faraó desde o oitavo ano do seu reinado até ao seu fim. Há até quem pense que o faraó se mudou para cá de Tebas para se distanciar do crescente poder do clero de Amon, antecipando, de certa forma, a reforma religiosa empreendida pelo seu filho Akhenaton. Seja como for, está documentado que Amenhotep III celebrou neste local todos os seus jubileus reais (anos 30, 34 e 37).
E como era Malkata? Embora atualmente só reste um extenso campo de ruínas, ainda é possível ver vestígios de alguns edifícios que nos dão uma ideia da sua majestade. Anos mais tarde, o local foi abruptamente abandonado, pelo que as fundações se conservaram em bastante bom estado, uma vez que nunca foram construídas por cima.
No complexo palaciano de Malkata, havia palácios interligados (nas paredes de alguns deles foram preservadas vibrantes cenas naturalistas de cores vivas), salas de audiências, um templo dedicado a Amon, além de residências para funcionários, servos e cortesãos. Mas talvez um dos elementos mais espetaculares de Malkata seja o grande lago artificial (conhecido como Birket Habu) que o faraó mandou construir e que, através de um canal, comunicava com o Nilo.
O lago tinha uma forma de T, media dois quilómetros de comprimento por um quilómetro de largura e, segundo os investigadores, além de ser um local de lazer (podemos imaginar a rainha Tiy passeando todos os entardeceres em sua barca acompanhada por suas servas), Birket Habu certamente desempenhou um papel importante nos jubileus de Amenhotep (ao sul do lago erguia-se um altar que foi construído para essas cerimónias sagradas).
É evidente que a localização de Malkata devia ser importante para o monarca, já que através de uma longa via o palácio real se ligava ao templo funerário ou dos milhões de anos de Amenhotep III, do qual hoje restam em pé, como testemunhas silenciosas, embora bastante deterioradas pelo passar do tempo e pelos elementos, os famosos colossos de Memnon.
Mas Amenhotep III não quis apenas erguer neste local a sua residência real e o seu templo funerário. O faraó ordenou a construção, nas proximidades, de uma cidade de nova planta, um assentamento de grandes dimensões que prestasse apoio logístico e administrativo ao seu complexo palaciano. Uma cidade chamada Ascensão de Aton (o disco solar, uma divindade que desempenharia um papel fundamental durante o reinado do seu filho e sucessor, Akhenaton).
A Ascensão de Aton também foi abandonada com o tempo, e as suas ruínas desapareceram sob as areias do deserto durante milénios, até que foram parcialmente escavadas na década de 1930 e, posteriormente, identificadas e escavadas em profundidade em 2020 por uma equipa de arqueólogos, liderada por Zahi Hawass, que procurava nas proximidades o templo funerário de Tutankhamon.
A cidade, que se estende entre o templo de Ramsés III em Medinet Habu e o templo de Amenhotep III em Malkata, e se encontra em excelente estado de conservação, foi batizada pelos seus descobridores como a Cidade Dourada Perdida e é a maior já encontrada no Egito. Os trabalhos realizados lá pelos arqueólogos revelaram vários bairros e distritos, tanto administrativos, industriais como residenciais. A datação do local pôde ser confirmada graças aos objetos encontrados lá, como anéis, escaravelhos, vasos de cerâmica coloridos e tijolos de barro com o cartucho de Amenhotep III inscrito neles.
Os investigadores estão convencidos de que este sítio será fundamental para esclarecer vários aspetos de um período tão importante, mas ao mesmo tempo conturbado, da história do Egito. Por exemplo, a descoberta de algumas inscrições revelou que aqui foram preparados alguns elementos relacionados com, pelo menos, um dos jubileus de Amenhotep III, como carne de vaca para os banquetes. Também foi encontrado um selo de barro que fazia referência ao Gempaatón, o templo dedicado ao disco solar Áton erguido em Karnak por Akhenaton, filho e sucessor do faraó.
Será que isto significa que, após a morte de Amenhotep III, o seu filho viveu em Malkata antes de transferir a capital do Egito para Amarna? E, mais importante ainda, por que razão transferiu a capital de Tebas para Amarna? Malkata voltou a ser ocupada após o abandono de Amarna, quando Tutankamão se tornou o novo faraó e restabeleceu o culto a Amon? Os arqueólogos esperam poder resolver todas estas questões apaixonantes algum dia. Talvez as impressionantes ruínas de Malkata e da Cidade da Ascensão de Aton guardem as respostas em segurança, esperando o momento em que possam ser reveladas…