De insetos, tofu e algas a carne cultivada em laboratório, a crescente pressão para reduzir o impacto ambiental da nossa alimentação está trazendo cada vez mais alternativas para substituir a carne tradicional nos nossos pratos.
Algumas propostas geram entusiasmo, outras certa desconfiança e até rejeição. Ousaríamos comer grilos? O sabor de um bife vegetal pode ser semelhante ao de um bife de vaca?
Na busca pelo «alimento ideal do futuro», existe uma opção com séculos de história, mas ainda bastante desconhecida. Referimo-nos aos cogumelos, que finalmente começam a receber a atenção que merecem.
O reino dos fungos não só oferece um acompanhamento gastronómico muito saboroso, como também constitui uma fonte de proteínas completa, sustentável e cultivável com poucos recursos. Esta inovação, desconhecida para muitos, pode revolucionar não só a nossa dieta, mas também a nossa relação com a produção alimentar.
E sem necessidade de luz solar nem animais de criação!
O alimento do futuro cresce na escuridão
Num mundo atravessado pela crise climática, pela perda de biodiversidade e por uma população em crescimento, a nossa alimentação tornou-se uma questão urgente a abordar. A produção de carne, um dos pilares da dieta global, é uma das atividades mais intensivas em recursos e emissões. Perante este panorama complexo, cientistas, empreendedores e organismos internacionais procuram soluções alternativas que sejam sustentáveis, nutritivas e escaláveis.
Uma das propostas mais promissoras não vem do reino vegetal, nem do animal, mas de um reino muitas vezes esquecido: o dos fungos. Longe de se limitar aos cogumelos que encontramos no supermercado, a micologia aplicada está a dar origem a um novo tipo de alimento chamado micoproteína. Trata-se de uma fonte rica em proteínas obtida a partir de fungos filamentosos. Silenciosa, eficiente e surpreendente, esta forma de nutrição fúngica pode ajudar-nos a redesenhar o menu do futuro.
Micoproteína: o que é e por que é tão promissora?
A micoproteína é uma fonte de proteínas obtida a partir do cultivo de fungos filamentosos como o Fusarium venenatum. Ao contrário dos cogumelos que são colhidos, estes fungos são fermentados em grandes biorreatores, com um consumo mínimo de recursos. O resultado é uma biomassa rica em proteínas, fibras e micronutrientes, com uma textura surpreendentemente semelhante à da carne.
Um dos produtos mais conhecidos elaborados com micoproteína é o Quorn. Embora esteja disponível há décadas em supermercados de vários países, o interesse por esta fonte alternativa disparou no último ano. De acordo com estudos, a produção de micoproteína requer menos terra e água do que a pecuária tradicional (com ligeiras diferenças entre suínos e bovinos) e gera menos emissões de gases de efeito estufa.
Numa altura em que precisamos de soluções alimentares mais sustentáveis e resilientes, a micoproteína não só compete com a carne, como redefine o que entendemos por «alimento».
Cultivar cogumelos em casa ou num arranha-céus
Para além dos laboratórios industriais, a produção de cogumelos comestíveis está a ganhar destaque em ambientes urbanos e circulares. Existem projetos que cultivam cogumelos em restos de borras de café, resíduos agrícolas ou cartão reciclado, transformando resíduos em alimentos de alto valor. Esta capacidade de crescimento sobre materiais residuais posiciona os cogumelos como aliados perfeitos da economia circular.
Em cidades como Paris, Londres ou Buenos Aires, iniciativas de agricultura vertical já estão a utilizar espaços subterrâneos ou estruturas modulares para cultivar cogumelos em condições controladas. É até possível fazê-lo em casa com pequenos kits que permitem colher em poucos dias, sem necessidade de terra ou luz solar.
De Paris a Buenos Aires
Em algumas grandes cidades, estão a utilizar espaços subterrâneos ou estruturas modulares para cultivar cogumelos em condições controladas
Ao mesmo tempo, startups e centros de inovação desenvolvem biotecnologias fúngicas que integram o cultivo e o processamento em sistemas compactos e escaláveis. Uma inovação que prevê um futuro em que produzir cogumelos poderá ser tão comum quanto assar pão. E talvez, em algum momento não muito distante, igualmente necessário.
Um menu com sabor a micélio?
Embora os benefícios da micoproteína sejam numerosos, a sua incorporação em massa na dieta global ainda enfrenta desafios, entre os quais se destacam as barreiras culturais, o desconhecimento e a resistência à mudança.
Para muitos, comer «cogumelos cultivados em tanques» parece uma ideia estranha, apesar de produtos semelhantes que consumimos diariamente — como o pão ou o iogurte — também serem resultado da fermentação.
No entanto, cada vez mais chefs, nutricionistas e consumidores estão a redescobrir o potencial culinário do reino fúngico. Desde filetes vegetais com textura carnuda a snacks proteicos ou substitutos de marisco, os cogumelos estão a provar que podem ser deliciosos, versáteis e, acima de tudo, sustentáveis!
Talvez o futuro da nossa alimentação não se dirija apenas para reduzir o consumo de carne, mas também para abraçar novas alternativas que estão entre nós há milhões de anos. Não nos esqueçamos, por outro lado, que ao comer cogumelos, ao mesmo tempo que nutrimos o nosso corpo, estamos a cultivar um mundo mais justo, diversificado e resiliente.
Este artigo foi publicado originalmente em The Conversation. Sergio Fuentes Antón é professor de Didática das Ciências Experimentais na Universidade de Salamanca.