A biodiversidade global parece ser regida por um padrão surpreendentemente uniforme, de acordo com uma pesquisa recente publicada na revista Nature Ecology & Evolution. O estudo revela que, independentemente do tipo de ambiente ou do grupo biológico analisado, as espécies tendem a se concentrar em zonas centrais, de onde se dispersam gradualmente para áreas menos povoadas em termos de diversidade.
A investigação foi liderada por Rubén Bernardo-Madrid, investigador da Universidade de Umeå (Suécia), que, juntamente com a sua equipa, examinou a distribuição de mais de 30 000 espécies, entre plantas, mamíferos, aves, répteis, raias e libélulas. Apesar da diversidade de formas de vida e condições ecológicas, os cientistas observaram um padrão consistente que sugere a existência de um mecanismo comum de organização ecológica.
Essas zonas centrais atuam como pontos de origem onde ocorrem as condições mais favoráveis para a sobrevivência e diversificação das espécies. Segundo Bernardo-Madrid: «Em cada biorregião, há sempre uma área central onde vive a maioria das espécies. A partir dessa zona, elas se expandem para áreas circundantes, mas apenas uma parte consegue se manter”.
A descoberta tem uma implicação direta na forma como entendemos a estrutura dos ecossistemas. As zonas centrais não apenas abrigam mais biodiversidade, mas também a geram, funcionando como motores ecológicos com uma influência desproporcional sobre o seu ambiente. A conclusão é clara: a sua conservação é prioritária.
Filtragem ambiental: a chave do padrão
O padrão observado é explicado pelo fenómeno conhecido como filtragem ambiental, um princípio que sustenta que apenas as espécies capazes de se adaptar a condições específicas podem estabelecer-se numa determinada área. A coautora Manuela González-Suárez, da Universidade de Reading, afirma: «Não importa se o fator limitante é o calor, o frio, a seca ou a salinidade. O resultado é sempre o mesmo: apenas as espécies que toleram as condições locais conseguem persistir».
Este conceito, até agora apenas teórico, foi validado empiricamente à escala global graças a este estudo. A consistência do padrão em vários ecossistemas e continentes oferece uma nova ferramenta para prever como os sistemas biológicos responderão às alterações ambientais globais.
A investigação também destaca a importância de incluir esta regra nas estratégias de conservação atuais. José Luis Tella, da Estação Biológica de Doñana, salienta: «Proteger estas zonas nucleares é essencial, pois representam prioridades críticas para as estratégias de conservação».
Compreender como a vida se organiza na Terra a partir de uma perspetiva global permitirá antecipar os impactos da crise climática, a perda de habitats e outros fatores de pressão ecológica. Ao identificar estas áreas-chave, otimiza-se a utilização dos recursos na conservação, concentrando os esforços onde o seu efeito pode ser mais duradouro e eficaz.
A ideia de que uma regra simples possa descrever a organização da vida num planeta tão diverso é, no mínimo, reveladora. Como salienta Joaquín Calatayud, investigador da Universidade Rey Juan Carlos: «Este padrão sugere que a vida na Terra pode ser, de certa forma, previsível».